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Amazônia 2019São Gabriel da Cachoeira

Ao contrário da mulher branca, onde o câncer de mama é o mais prevalente, o tumor que mais acomete as mulheres indígenas é o de colo de útero. Este tipo de câncer é passível de prevenção, uma vez que é indolente, ou seja, muitos anos transcorrem após o primeiro exame de Papanicolaou alterado (o preventivo que a mulher colhe no consultório do ginecologista) até o desenvolvimento da lesão invasiva.
No entanto, as indígenas têm por vezes muita dificuldade em realizar os exames preventivos, porque habitam regiões isoladas, sem médicos ou profissionais de saúde.
A ONG Expedicionários da Saúde atua no sentido de inverter esta equação. A indígena não consegue ir até o serviço de saúde para se tratar? Pois nós iremos até as indígenas! Desta vez estamos de partida para São Gabriel da Cachoeira, também conhecida como Cabeça do Cachorro, pois seu território tem este formato. Fica no Amazonas, extremo noroeste do Brasil e faz fronteira com a Colômbia e Venezuela.
Lá fizemos cirurgias em mulheres com lesões que, se não tratadas, tornar-se-ão (Temer hahaha) cânceres de colo de útero. Com isto elas podem levar vidas normais, sem sequelas, sem mutilações. Vida longa às nossas indígenas!
A Missão aconteceu entre os dias 7 e 11 de Agosto de 2019.

  • Dia 1
  • Dia 2
  • Dia 3
  • Dia 4

Como em toda expedição que se preze, sempre rola um stress básico no trajeto. Quando estávamos embarcadas no avião fomos avisadas de que havia um defeito na porta e que seria necessário trocar de aeronave. Desce todo mundo, vai pro ônibus, espera, espera… sobe em outro avião.

Conseguimos decolar. Quatro horas depois, quando estávamos sobrevoando o aeroporto, o piloto nos avisa que há nebulosidade na pista de pouso e que talvez seja necessário pousar em Boa Vista, Roraima! Olho para os lados e geral já está com as mãos juntas, rezando. Se a gente pousasse em Boa Vista teríamos que pegar um barco que levaria 22 horas até chegar em São Gabriel da Cachoeira. Perderíamos um dia inteiro da missão. O piloto tenta pousar, não consegue. Arremete. Vai para o outro lado da pista, tenta novamente…

Pousamos!! Ufa! Nossa equipe comemora.

Após algumas horas de espera no aeroporto de Manaus embarcamos em um avião menorzinho que nos leva até São Gabriel da Cachoeira. Chegamos, nos instalamos no ISA (Instituto Socioambiental), tomamos um rápido café da manhã e vamos para o hospital do exército, onde realizaremos os atendimentos e as cirurgias.

Temos duas salas disponibilizadas para a EDS (Expedicionários da Saúde). Arrumamos todos os equipamentos e começarmos a atender após o almoço.

Temos um sistema de atendimento eletrônico, apelidado de Ticunet (uma das etnias que a EDS atende se chama Ticuna). Estamos aprendendo a usar e apanhamos um pouco.

Uma das pacientes tem um nódulo grande de mama. Após a consulta fazemos um ultrassom e optamos por operá-la no dia seguinte.

Além disso, fazemos duas cirurgias em indígenas que têm lesões pré-cancerosas no colo do útero e mais alguns atendimentos, de mulheres que já passaram por esta cirurgia e estão fazendo os controles necessários após.

Como passamos a noite quase em claro viajando, é um pouco difícil manter o pique, mas encerramos o dia de trabalho.

De noite comemos peixes de rio maravilhosos. Mas logo retornamos ao ISA e desmaiamos de cansaço.

Como em toda expedição que se preze, sempre rola um stress básico no trajeto. Quando estávamos embarcadas no avião fomos avisadas de que havia um defeito na porta e que seria necessário trocar de aeronave. Desce todo mundo, vai pro ônibus, espera, espera… sobe em outro avião.

Conseguimos decolar. Quatro horas depois, quando estávamos sobrevoando o aeroporto, o piloto nos avisa que há nebulosidade na pista de pouso e que talvez seja necessário pousar em Boa Vista, Roraima! Olho para os lados e geral já está com as mãos juntas, rezando. Se a gente pousasse em Boa Vista teríamos que pegar um barco que levaria 22 horas até chegar em São Gabriel da Cachoeira. Perderíamos um dia inteiro da missão. O piloto tenta pousar, não consegue. Arremete. Vai para o outro lado da pista, tenta novamente…

Pousamos!! Ufa! Nossa equipe comemora.

Após algumas horas de espera no aeroporto de Manaus embarcamos em um avião menorzinho que nos leva até São Gabriel da Cachoeira. Chegamos, nos instalamos no ISA (Instituto Socioambiental), tomamos um rápido café da manhã e vamos para o hospital do exército, onde realizaremos os atendimentos e as cirurgias.

Temos duas salas disponibilizadas para a EDS (Expedicionários da Saúde). Arrumamos todos os equipamentos e começarmos a atender após o almoço.

Temos um sistema de atendimento eletrônico, apelidado de Ticunet (uma das etnias que a EDS atende se chama Ticuna). Estamos aprendendo a usar e apanhamos um pouco.

Uma das pacientes tem um nódulo grande de mama. Após a consulta fazemos um ultrassom e optamos por operá-la no dia seguinte.

Além disso, fazemos duas cirurgias em indígenas que têm lesões pré-cancerosas no colo do útero e mais alguns atendimentos, de mulheres que já passaram por esta cirurgia e estão fazendo os controles necessários após.

Como passamos a noite quase em claro viajando, é um pouco difícil manter o pique, mas encerramos o dia de trabalho.

De noite comemos peixes de rio maravilhosos. Mas logo retornamos ao ISA e desmaiamos de cansaço.

Hoje fomos cedinho para o hospital pois havíamos agendado a cirurgia da paciente com o nódulo de mama para as 7h30 da manhã. A cirurgia transcorre bem, quase não sangra. Faço pontos intradérmicos para a cicatriz ficar discreta.

Quem me auxilia é a Sandra, uma das outras ginecologistas que está na missão.

Enquanto isso a Iria (GO que coordena a missão) está atendendo e fazendo as cirurgias do colo do útero (CAF ou EZT). O sensacional é que varias mulheres que já foram operadas por ela em outras missões estão vindo para os controles após CAF, todas livres de lesão. Caso não tivesse havido esta iniciativa elas estariam doentes de câncer de colo de útero.

Após a cirurgia começamos a atender no ambulatório. Almoçamos correndo e voltamos.

E aí começam e chegar casos cirúrgicos, muitos! Uma senhora com câncer de mama bilateral, que ficou meses à espera da biópsia em Manaus, longe da família, sem conseguir fazer. O filho a traz pois ela não fala português. Ele nos diz que ela se recusa a ser operada. Mas a mama direita está ulcerada, ela precisa da cirurgia. Eles vão embora e nós ficamos com a sensação de impotência. Uma outra paciente, mais jovem, tem um tumor de mama tão grande que ocupa a mama toda. Parece que ela tem uma prótese gigante só de um lado! Nos diz que há quatro anos tenta ser operada sem sucesso. Uma senhora tem lesão pré neoplásica (a que antecede o câncer) no colo de útero, mas não tolera o procedimento no ambulatório, com anestesia local. Optamos por fazer no centro cirúrgico também. Outra moça aparece (esta é venezuelana) com uma lesão que refere estar crescendo na mama direita. Diz sentir dor. Agendamos para o dia seguinte também.

Amanhã teremos a manhã lotada de cirurgias. O curioso é que eu sou mastologista mas não fizemos qualquer busca por pacientes com leões mamárias, elas simplesmente apareceram. A Íria esteve na missão antes desta e falou que não houve casos de mama. Uma coincidência (?) interessante.

Terminamos os atendimentos às 19h30. Jantamos e cama, afinal amanhã o dia será cheio.

Soubemos que a nossa expedição foi reportagem de capa no jornal Correio Popular no sábado (10/08/2019). Nela se falou sobre a trajetória dos Expedicionários da Saúde e, em especial, sobre a Missão “Cor de Rosa”, a missão de agora. Atendemos mais de 60 mulheres indígenas!

Hoje chegamos cedinho no hospital pois temos cinco cirurgias mais os atendimentos e CAFs. Eu e Iria vamos para o centro cirúrgico e a Sandra fica atendendo.
A primeira paciente é a senhora com a lesão no colo do útero. A Aline (anestesista) seda a paciente e a Iria consegue com tranquilidade fazer o procedimento. Em seguida opero a moça do tumor enorme de mama. De tão grande ele não cabe nos potes que trouxemos. Consigo comprar mais tarde um pote de creme de cabelos enorme.
Retiramos o conteúdo do pote e, com algum esforço, o tumor entra nele.
A terceira paciente é a senhora que tem câncer de mama e não desejava ser operada. Felizmente ela decide vir. Quem une a família indígena é a mulher. Quando ela precisa sair para se tratar de alguma doença e fica meses longe de casa (como esta senhora quando foi para Manaus), por vezes ao retornar a família está desestruturada. Poder oferecer a cirurgia a ela em um local próximo à sua família é uma grande benefício. Começo pela mama menos acometida. Retiro dois nódulos bastante suspeitos, endurecidos e irregulares. Trocamos o instrumental cirúrgico e começo a operar a mama com o tumor ulcerado. Uma das coisas que ela falou veementemente antes da cirurgia foi que não aceitava em hipótese alguma perder a mama. A lesão está grande e eu preciso tirar o tumor com alguma margem. Consigo preservar a mama, mas o tamanho ficou reduzido em relação à outra.

Em seguida operamos a moça da Venezuela com queixa de nódulo e dor. O nódulo é bem delimitado e se rompe no meio da cirurgia. Parece ser uma galactocele, uma lesão cística, o que sai é uma substância que lembra leite talhado. Pertinho dele palpo mais um nódulo, que retiro também.

Almoçamos em cinco minutos (lembrei dos meus tempos de estágio no centro obstétrico da residência. Foi neste estágio que adquiri o péssimo hábito de comer rápido) e vamos para o ambulatório finalizar os atendimentos.

Hoje é nosso último dia de atendimentos, amanhã vamos rever as pacientes operadas e guardar todo o material.
De noite eu como pirarucu pela terceira vez consecutiva. Melhor peixe do mundo!

Último dia! Amanhã embarcaremos de volta para Campinas.

Hoje fomos a uma tapiocaria deliciosa tomar café da manhã. Em seguida fomos ao hospital ver as pacientes que operamos ontem. Também chegaram três pacientes novas, que souberam que havia ginecologistas atendendo. Vejo as pacientes que operei, retiro os drenos, todas estão ótimas. Estão em uso de anti-inflamatório e antibiótico e vão retirar os pontos na UBS.

Uma das pacientes que chegou hoje é o caso mais grave de toda a expedição. Um câncer de mama ulcerado. O tumor ocupa toda a mama e os linfonodos axilares estão acometidos bilateralmente. Além disso, a pele da mama tem um aspecto conhecido como peau d’orange (casca de laranja), que é um sinal de que a pele também está tomada pelo tumor. Perto da aréola há uma área com necrose (morte do tecido). Quando os linfonodos da axila contralateral estão positivos significa que o tumor já se espalhou, não é mais possível curar a paciente. Como partiremos amanhã, não poderei fazer a biópsia que eu gostaria, que seria retirar parte do tumor com um pedaço da pele. Não tem como deixar uma paciente operada sem ao menos vê-la no dia seguinte. Mesmo contando com a estrutura do hospital do exército isto não seria correto com a equipe residente.

Optamos então por fazer uma ecografia e uma punção do tumor. Íria faz a ecografia, que confirma o exame clinico. Faço a punção e enviamos o material para análise. Sandra vai com a paciente até a CASAI (Casa de Saúde Indígena) e explica à enfermeira que ela precisa ir para Manaus para se tratar e que o caso é urgente. As indígenas que moram longe de Sanga vêm de avião, helicóptero, barco ou carro e ficam na CASAI enquanto as atendemos.

Esta indígena é da etnia Hupda, eles são muito empobrecidos, moram no meio da selva e não falam português. Ela veio sem intérprete e acreditamos que não entendeu nada do que fizemos com ela. Estava com escabiose e não trouxemos medicamentos para tratar esta parasitose, mas passamos a informação ao staff da CASAI para que ela seja medicada.

Sempre que vou para as missões (esta foi minha sexta) eu doo praticamente tudo o que levo: roupas, chinelos, sapatos, toalha, cangas… Tinha levado um saco de roupas para doar e deixei com ela. Com certeza foi a pessoa mais carente que atendemos.

Finalmente conseguimos desmontar e guardar todo o nosso material. Tiramos fotos na entrada do hospital com o tenente Carlo (que possibilitou o trabalho aqui) e com a sua equipe. Eles foram muito solícitos, atenderam todos os nossos pedidos. Com certeza não teríamos atingido os objetivos desejados sem o apoio do staff do Hospital de Guarnição de São Gabriel da Cachoeira.

Saímos do hospital umas 16h mortos de fome. E quem disse que tem restaurante aberto a esta hora? Depois de várias buscas infrutíferas, conseguimos uma cerveja de milho, litrão ainda (ui!) e duas porções de calabresa. As meninas também compram pão de forma e queijo no mercadinho. Este é nosso nada lauto “almoço”. Estamos às margens do rio Negro. Entro na água rapidinho, sair daqui sem ter entrado no rio seria um pecado.

Dormimos uma horinha e vamos jantar na Cave du Conde. Neste restaurante há poucos pratos e um deles tem formigas saúvas (o prato chama-se Ralo Baniwa). Eu já havia comido as formigas na missão em Sanga em 2012. Quis comer o prato de novo, as formigas são crocantes e têm gosto de menta. Todos os pratos são muito gostosos. Comemos também carpaccio de cubiu, um tipo de fruta local.

Vamos para o ISA e dormimos, amanhã acordaremos cedo para o longo caminho de volta.

Estamos muito felizes! Operamos 15 mulheres com doenças no colo do útero ou na mama e atendemos 62 mulheres, um resultado acima do esperado.  We can do it!

Nossa equipe foi composta por mim, pela Iria (a nossa coordenadora), Sandra (GO super do bem que completou nosso trio), Aline, a pequena notável, dublê de anestesista e “farmacêutica”, pois entregou as medicações e orientou as pacientes após os atendimentos, Sandrinha (enfermeira que faz as coisas acontecerem), Genario, que chegou 4 dias antes de todo mundo e fez os trâmites e o network para que a missão fosse possível, Cecília e Adriana, as enfermeiras que nos ajudaram 100% do tempo, ficando conosco nos consultórios e no centro cirúrgico.

Eu sempre digo que um dos motivos que me leva às missões é que os voluntários são pessoas muito especiais, que curtem o que fazem. Desta vez não foi diferente! Trabalhamos muito, brigamos um pouco (faz parte) e demos muitas risadas também.

Para encerrar este singelo diário, quero agradecer aos coordenadores da EDS (Ricardo e Marcia), à Mona e

à Inês, que fizeram parte da logística e ao Braguinha que fez o Ticunet. Os dados estarão guardados para sempre.

Agradeço também à toda a equipe do hospital (vocês foram sensacionais!), ao Exército Brasileiro, ao ISA (Instituto Socioambiental) que nos hospedou, ao DSEI ARN, à Elida da SESAI, à Secretaria de Saúde do Município, à CASAI e ao Caldas, que ajudou a levar a mulherada para Sanga.

Valeu, EDS! Até a próxima!

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